quinta-feira, 21 de setembro de 2006

aprendendo a amar clarice

"E agora era muito tarde.

Quando inventara ouvir a notícia, a moça retrocedera até estar vestida com saias longas e alisar bandós na testa.

Mas agora no sonho pôde recuar até encontrar enfim: que era grega.

"Como a da revista", e ruborizou-se agitada. Sonhar ser grega era a única maneira de não se escandalizar, e de explicar seu segredo em forma de segredo; conhecer-se de outro modo seria o medo.

Ela era antes dos gregos pensarem ainda, tão perigoso seria pensar.

Grega numa cidade ainda não erguida, procurando designar cada coisa para que depois, através dos séculos, elas tivessem o sentido de seus nomes.

E sua vida erguia, com outras vidas pacientes, o que se perderia mais tarde na própria forma das coisas. Apontava com o dedo, a grega sem rosto. E seu destino como grega então era tão inconsciente quanto agora em S. Geraldo. O que restara de tão longe? o que restara da Grécia? a insistência: pois que ela ainda apontava."


LISPECTOR, Clarice. A Cidade Sitiada.

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