sábado, 20 de dezembro de 2008

A EXISTÊNCIA DE TERESA

CARTA P/ O AMIGO

A noite se aprofundando com suas raízes negras sobre a terra. Eu sou um suspiro e respiro cheia de mistério. Minha vida espalhada pelos confins dos mundos. Quero me despedaçar em infinitos átomos e povoar o universo inteiro. O movimento da minha mão a balançar a caneta é rítmico e cíclico como as estações do ano. Está chegando dezembro e as pessoas engendram seus enfeites e espíritos natalinos. Eu estou viva e preciso de amor. Estou esgotada pela confusão dos homens e mesmo assim tenho forças para precisar do amor.
De repente, não quero livros, nem monumentos, não quero nomes, não quero posteridade. Não quero Iso ou Aquilo. Quero ser e deixar escorrer o momento, esse momento que se esgota, os diálogos na televisão ligada ali na sala e esse forro de mesa com peixinhos, navios e faróis. Quero eu nessa cena absurda, eu que movo minhas pernas frenéticas e morro um pouco a cada segundo. Quero estar para ser o inverossímil humano. Estou trespassada pelo heroísmo de nossa derrota diariamente anunciada. Lá de fora, a noite se afunda e engole ainda mais a terra, e aqui dentro de mim minha escuridão sobrevive graças a minha pequena e insistente chama de vida: Amor! Amor! Amor! Esperança ao fim! Em breve, a escuridão será plena e então ela mesma se extinguirá no vazio opaco da não-existência, e minha mão não mais balançará sobre a terra e minha boca não mais pronunciará meus cantos de amor. Em breve, muito mais breve do que eu espero, minha alma não mais se refletirá no fulgor dos meus olhos, meu ser secará sobre a terra, e minha morte, por sua vez, se despedaçará em infinitos átomos e abarcará o mundo inteiro, que não será sequer o vulto de uma lembrança.

08/11/2008

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

GORKI, Máximo

"(...)
E acrescentou com um acento de tristeza:
- Mas raro sucede que eu queira alguma cousa.
- Pelo contrário, eu quero sempre alguma cousa - replicou Malva. - Quero... o quê? Nem sei. Às vezes quisera meter-me numa barca e perder-me ao longe na vastidão infinita das ondas. Tão depressa sinto lástima de todos, sobretudo de mim própria, como sinto desejos de matar todos e dar a mim própria uma morte horrível. Quero rir e me aborreço, porque, afinal, os homens todos não merecem um pouco de atenção; são volúveis como piões.
- De madeira podre - acrescentou Serejka. - Bem dizia eu: não és gato, nem pássaro, nem pez... és um pouco de tudo... em nada te pareces com as outras mulheres.
- Graças a Deus - replicou ela, sorrindo.
(...)"

In.: GORKI. OS VAGABUNDOS - Malva.
Tradução de Araujo Alves

domingo, 14 de dezembro de 2008

carta p/ d. de olhos cálidos

(...) Para poder lhe dizer exatamente (ou quase isso) o que se passa comigo ultimamente somente por meio de misteriosas metáforas.
Pois o meu mundo é insano como o olhar da menina psicótica que perde sua filha para os homens do governo.
Pois estamos separados - todos - desde o início até o fim.
Pois é triste como o pai alcóolatra sendo carregado pelas filhas evangélicas bar afora, tão triste e cheio de fé como todos nos bares.
Pois estamos separados, todos - desde o início até o fim.
Pois é devastador como o crescimento potencial da ganância dos homens, nossos filhos e irmãos, nossos reflexos.
Pois eis-me eu.
Numa ilha. Numa clínica. Numa prisão.
Lendo-me fria no banheiro.
No berçário. No caixão.
(...)


sábado, 13 de dezembro de 2008

fazendo dezembro no campus

acho hoje no pio desse pássaro desconhecido
e dessas árvores milenares
que aprender a escrever um livro
é perceber que é mais proveitoso o caminhar
que o destino final em si.


É tão bom assim
Quanto o improviso de um blues
Com o azul ou o amarelo
Do céu e da flor do agora.


quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

O AMOR COM SEXO

Um transe
Bem transado.
A transa
Sem dissimulado.


no raiar de novembro de 2008

sábado, 6 de dezembro de 2008

TSVETAEVA, Marina

À VIDA

Não roubarás minha cor
Vermelha, de rio que estua.
Sou recusa: és caçador.
Persegues: eu sou a fuga.

Não dou minha alma cativa!
Colhido em pleno disparo,
Curva o pescoço o cavalo
Árabe -
E abre a veia da vida.


Apesar disso, ela trotou

até se suicidar em 1941.